Os 10 Melhores Discos de 2021 — e uns extras…

E chegamos ao fim desse ano infernal em todos os sentidos!

Fazia tempo que eu não escrevia por aqui, por absoluta preguiça e falta de tempo, paciência, vontade ou sem assunto mesmo.

Em breve, talvez, teremos mais novidades por aqui, ou ali, ou em qualquer lugar.

Como sempre faço desde que me conheço por gente, listo discos que gostei todo o ano, as vezes só pra mim, as vezes compartilho pro mundo.

Em 2020 o número de discos bons, musicas boas e artistas novos foi tanto que me esqueci completamente de colocar isso numa lista final, quem sabe algum dia eu volte e o faça, pois ainda reverbera na minha cabeça e coração alguns desses artistas incríveis que fizeram o ano de pandemia mais palatável.

2021 já não foi tão próspero, na real foi infinitamente mais fraco.

Riz aqui um trabalho de espremer pra tirar o que me pareceu o melhor desse ano ainda confuso e ainda desafiador e fazer um

O principal consenso sobre o cenário da musica de 2021 é que não há consenso algum. Cada cabeça literalmente é uma sentença e os lugares comuns estão cada vez mais raros e incomuns.

Com as bolhas de interesse cada vez mais retro-alimentadas por si mesmas, e cada uma ficando cada vez mais limitada ou “nichada” é praticamente impossível encontrar 3 publicações especializadas que cravem o mesmo ou a mesma artista. Com os lobbys e “jabás” cada vez mais especializados, será cada vez mais difícil um consenso.

Isso pode ser bom ou não.

Enfim.

De fora da minha lista ficaram discos que talvez eu gostasse mas que nao escutei a tempo, como o caso do War on Drugs ou discos que simplesmente nao entendi a adoração e deixei de fora pra nao embarcar no hype por embarcar, assim aqui nao tem Japanese Breakfast nem Arlo Parks. E claro, Kanye West que eu acho o maior artista do século XX ficou de fora pois seu Donda é um erro.

E vamos em frente.

Menções honrosas fora do top 10, mas que merecem sua minima atenção:

Daniel Avery – Together in Static

Esse eu descobri por total arbitrariedade dos malditos/benditos algoritmos, que por algum motivo que ultrapassa minha compreensão, acham que gosto de musica estranha eletrônica. Erraram e acertaram, mas esse Daniel foi grata surpresa. Seu som pega ali pela cauda do Future Sound Of London, pelas barbatanas do Aphex Twin e se agarra nas cabeleiras do Brian Eno num mix de ambient music calminho mas nervoso com um tecno pesado e lento e uma fumaça seca vinda das batidas bem resolvidas na sala de comando. Ótimo disco de um ótimo artista de música eletrônica de verdade.

Courtney Barnett – Things Take Time, Take Time

E a talentosa e incrível cantora, compositora e guitarrista australiana lançou mais um daqueles discos que todo o mundo que gosta de rock e indie-rock vai comprar, ouvir de vez em quando e acessar daqui há alguns anos com aquele sorriso e prazer de escutar uma velha amiga trazendo suas canções sensacionais e simples. Ainda me incomoda um pouco o jeito com que Courtney termina suas frases sempre caindo, o que acabou por virar sua marca registrada e um pouco do seu charme, as vezes fica soando como um cacoete que talvez impeça ela de alçar voos maiores dos quais ela é totalmente capaz.

Mogwai – As The Love Continues.

Eis que de repente, essa veteraníssima banda escocesa de “post-rock”ou instrumental barulhento que faz suas músicas conforme as marés de guitarras pra delimitar os barulhos altíssimos e os silêncios abissais conseguiu com esse disco que não é muito melhor e nem muito pior que seus outros 10 ou 22 que eles já fizeram, alcançar o topo da parada “normal” britânica. no inicio do ano. Baita feito! O Mogwai por absoluta preguiça desse que vos escreve foi o disco que mais ouvi sem ouvir no meu Spotify.

Sam Mehran – Cold Brew.

História triste acerca desse jovem talento. Sam já não está entre nós desde 2018, quando lamentavelmente resolveu dar fim a sua estadia no Planeta Terra. Esse álbum é um conglomerado de demos e ideias gravadas que sua família e amigos/parceiros encontraram em seu computador e a partir deles, colocaram no mundo um álbum póstumo que mostra o quão brilhante, confuso, bem-humorado e promissor trabalho esse jovem punk australiano-ingles-estadounidense poderia ter feito.

Bremer / Mccoy – Natten

Diretamente de Copenhagen, essa dupla de músicos/produtores dinarmarqueses com certeza, entregam ao mundo um belo exemplo de jazz/ambient/minimal/sul-escandinavo. Flertando forte com o eletrônico, com compassos longos, elegantemente distribuídos por faixas suaves e tensas, cometeram um belíssimo álbum pra se desligar do universo por alguns minutos e reorganizar os pensamentos.

Public Service Broadcasting – Bright Magic

Esse eu conheci no susto, o PSB é um grupo inglês que trafega pelas linhas da modernidade que atinge aquele público pequeno mas atento. Nesse 4º álbum, eles jogaram tudo que aprenderam de música alemã moderna e aquele clima inescapável de Bowie Low, em um disco vestido nos panos do eletro-kraut-pop chucrutês.

E agora nosso top 10:

  • 10. La Femme – Paradigmes

Esse não deve ter entrado em nenhuma lista, e até que eu entendo. O som dessa banda francesa tem um que de Garbage (pop + guitarra rock + roupa eletrônica velho) mas com ótimas soluções melódicas, bons vocais, alterando entre masculino e feminino (em algum momento parecendo um lance Gainsbourg-Bardot transando um swingue musical com Jay-Z-Alicia Keys), fazem desse álbum uma aberração em pleno 2021. Na real, esse disco parece um restaurante que serve sushi, vatapá e churrasco. Cada faixa parece uma coisa, unidade Zero, mas se as músicas sao legais precisar ter unidade?

  • 9. Iceage – Seek Shelter

Esse grupo dinamarquês tem trilhado pela fronteira do punk rock desesperado com hardcore lento há quase 10 anos e parecia feliz com esse caminho, até que um belo dia eles devem ter mudado a tarja da medicação, se trancaram em estúdio com a lenda da barulheira de pedaleira de guitarra Sonic Boom (Spaceman 3) e me saem com um inesperado e ambicioso álbum mezzo Stones-Their Satanic mezzo Spiritualized-Ladies and Gentleman com um tiquinho de gospel branco e acertam em cheio. Ótimas ideias melódicas, ótimas composições vindo em primeiro plano e propostas inéditas no seu som. O Iceage mostrou que tem mais a oferecer do que nós e acho que eles também achavam que tinham. Discasso pra ir degustando calmamente.

  • 8. Little Simz – Sometimes I Might Be Introvert

Adquiri minha carteirinha de jovem pra aderir ao hype Dua Lipa ano passado e como tava na validade usei pra aderir a Little Simz esse ano. Brincadeiras a parte, Little Simz não tava no meu radar musical até pessoas de gostos e origens ultra distintas começarem a trazer o nome da moça a tona. Parei pra ouvir e gostei. Rap com elegância, boa produção pensada e arquitetada pra colocar a artista em uns degraus acima de onde estava. O disco tem aquele cheiro de Miseducation of Lauryn Hill mas faltou aquele hit pra furar todas as bolhas e coloca-la no primeiro plano de todo o mundo.

  • 7. Dazy – The Crowded Mind

Total inclusão de ultima hora e já estou absolutamente in love por esse jovem artista residente de Richmond – Virginia. Power pop, guitar rock com cheiro de Sugar, de Pixies, De Jesus and Mary Chain, guitarras altas, ardidas e precisas, senso pop aguçado, bons ganchos e refrões, duvido que você encontre por ai algo tão apaixonante.

  • 6. Illuminati Hotties – Let Me Do One More

Sarah Tudzin é a cantora, produtora, guitarrista e engenheira de som que lidera o Illuminati e que já coloca sua deliciosa e esporrenta guitar band entre os meus shows-objetos-de-desejo pra quando conseguirmos sair do nosso casulo e podermos ver um show em algum país distante com população vacinada contra a Covid. Guitar rock dos bons, vocais como tem que ser, a moça enche nosso peito de esperança que se todas as guitarras elétricas e demais geringonças caírem nas mãos certas, teremos musica boa sempre.

  • 5. Silk Sonic – An Evening with

Projeto dos craques Bruno Mars e Anderson Paak, que resolveram juntar em música pop, todo o ouro que eles absorveram a vida inteira vindo de Commodores, Gap Band, Manhattans, Floaters, Temptations, Isley Brothers e dos inúmeros grupos musicais da Filadélfia setentista e ainda colocaram aquela malicia, aquele tempero em composições que passariam por pastiches sonoros em mãos erradas, mas que no colo dos dois temos o disco black pop mais delicioso em anos. Eles vão continuar suas carreiras vitoriosas solos, mas se de vez em quando se juntarem pra mais discos como esse, ficaremos aqui na geral gritando gol toda a vez.

  • 4. Floating Points, Pharoah Sanders and London Symphony Orchestra – Promises

Anotem ai, Promises vai ser um daqueles discos que ouviremos falar muito em alguns anos, pois é absolutamente anacrônico que um álbum que traga um cara que tocou com John e Alice Coltrane, Sun Ra, reinventou a parada do jazz e do free-jazz como Pharoah que saiu da sua toca pra dar moral para um produtor de musica eletrônica talentoso mas que tava ali na beirada e que colocou na paleta do Pharoah e na estante dos músicos da London Symphony Orchestra uma peça minimalista eletrônica, longa, lenta, de intervalos sônicos doces e chapados e atemporais cujo resultado é a beleza revestida de pequenas capsulas pra deleite que só os muito pacientes conseguirão apreciar. Vem pra essa turma!

  • 3. Mdou Moctar – Afrique Victime

Diretamente de Agadez, no Niger pais ali da Africa Ocidental, vizinho do Mali, da Nigéria e do Chade me sai um dos mais incríveis discos de rock com cheiro sessentista, guitarristico e que não parece com muita coisa que eu tenha ouvido vindo ali da região, e olha que de lá saiu o Tinariwen que é literalmente de outro mundo. Multi-cultural, com gravações em Los Angeles e estadia pela Europa, o Mdou Moctar sai em turnê pelo mundo esse ano, o que deve levar a banda a outro patamar. Merecido. Discasso!

  • 2. Parquet Courts – Symphathy for Life

Outra banda indie chegando aos seus 10 anos de existência e soltando um petardo. Na real, eles não lançaram discos ruins, mas fazia tempo que eles não acertavam tão na mosca, acho que eu não ouvia um disco deles tão bom assim desde Light Up Gold no longínquo 2012. No Parquet tem um pouco de tudo o que é bom: Power Pop, new wave revisitada, guitar rock, low-fi 90’s e ainda cabe umas experimentações maneiras no lado B. Refrescante, arejado e legal. É de mais bandas como o Parquet no mundo que a gente precisa.

  • 1. Black Midi – Cascade

Se existe uma banda que faz um som quase totalmente original dentro do que ainda é possível fazer de original considerando todas as limitações impostas pelas décadas de experimentos rock do passado repleto de boa musica e boas ideias e dentro do uso dos mesmos instrumentos usados por todo o mundo desde sempre, o Black Midi chega ao seu segundo disco muito parecido com o que já tinha feito no seu álbum de estreia, mas isso não significa necessariamente um problema, já que ambos os discos são perturbadores, criativos, improváveis em seus contornos e decisões e fazem da banda, uma das mais instigantes e recompensadoras experiências sonoras não só desse 2021, mas desde seu surgimento.

Como se diz, essa é uma banda que cobra um ingresso caro pra adentrar ao seu som, não é tão palatável ou superficial, mas uma vez dentro da proposta sônica da banda, tudo fica mais claro e melhor.

Vida longa ao Black Midi.

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Journey In Satchidananda – Alice Coltrane (1970)

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Fritura transcendental!

Orgia oriental com tempos indefiníveis e livres.

Confesso que tenho um pouco de preguiça de jazz punheteiro ou fusion, mas eu simplesmente adoro esse álbum e descobri que Mark Arm, um dos meus ídolos, é também fã desse disco.

Alice foi esposa de John Coltrane e também era uma tremenda musicista.

Tocava basicamente piano e harpa.

Fez som quando seu marido estava vivo e suas ideias teriam ali no aconchego do lar dos Coltranes ajudado o seu João a definir que seu som seria um jazz desamarrado e descontrolado no seus discos finais.

Ou será que foi o contrário?

Enfim.

Fato é: Alice é artista de jazz de primeira, tinha uma pá de idéias muito loucas com seu som e se juntou a uma trupe muito feroz para chegar aos sulcos quase sagrados que este play traz aos nossos ouvidos.

Influenciada na época pelos ensinamentos do seu então mentor espiritual Swami Satchidananda, que pregava algo como o “Amor Universal ou Deus em Ação”, o disco tem toda uma orientação pesada na India e no Oriente.

5 faixas demolidoras com a presença de monstros como Pharoah Sanders, Rashied Ali, Charlie Haden e outros, o álbum é muito carregado do espirito sincero que muitos artistas carregavam influenciados pela cultura indiana e sua busca perseverante por conhecimento, iluminação, Deus e sei lá mais o que.

Essa busca fez com que muitos caras se atirassem de cabeça nessa viagem.

O som desse álbum é inacreditável! O que ouvimos aqui é a captura fonográfica de músicos que estavam no seu auge e com liberdade absoluta pra pirar.

Recomendo ouvir esse álbum ao som de um goró e com luzes baixas.

Om Shanti!


The Lord High Fixers – Group Improvisation…that’s Music! (1997)

Austin, no Texas deve ter alguma substancia alucinógena em sua água. Ou alguma coisa alucinógena no seu ambiente, porque as bandas que surgiram por lá e ainda surgem tem uma pegada e uma maluquice em seus dnas que nenhuma outra cidade no mundo consegue gerar.

Olha a lista: 13th Floor Elevators, The Huns, Big Boys, White Denim, Spoon, Okkervill River, …And You Know Us By The Trail of Dead entre outras.

Todas elas tem um que diferente dos similares.

E o The Lord High Fixers é ou foi uma delas.

Punk de garagem por excelência, o Lord não ganhou muita projeção porque o mercado é muito competitivo e eles não cederam um milímetro na sua postura para fazer sucesso ou ganhar publico e acabaram restritos a um grupo de aficionados como eu.

Fiéis aos garageiros que os precederam na história, a banda praticou o puro soul-punk que pintou com mais força nos anos 90 e que seguiu década adentro através de artistas como Dirtbombs, BellRays, entre outros.

Divertido, alto e barulhento, esse álbum é uma colagem ininterrupta de canções próprias com covers dispares. O disco abre com “Lower Egypt” Do Pharoah Sanders, fecha com “Young Man Blues” do genial Mose Allison e no meio ainda cabem versões poderosas de “Come See About Me”, sucesso na voz das Supremes e “Everybody’s Got Something To Hide” dos Beatles.

De tirar o folego, Group Improvisation é um balsamo de rock adulto em qualquer estado e situação.

Aproveite sem moderação.