Quando se lida com paixão, racionalidade passa longe e quando é paixão cega, a racionalidade sequer existe.
Tudo isso pra começar a dissertar sobre o novo álbum de inéditas do Jesus & Mary Chain intitulado Damage And Joy.
Parido em 24 de março, Damage é o primeiro de inéditas da dupla escocesa desde Munki (1998).
A importância do Jesus para a história do rock é relativa pois influenciou menos gente do que parece e quando se fala de bandas dos anos 80 é bem menos lembrada que alguns contemporâneos como Smiths ou R.E.M. ou mesmo My Bloody Valentine.
Na real, pouco importa, o Jesus é minha banda favorita de todo o sempre, e sempre o será até o fim dos tempos.
Paixões eternas são “imexíveis”…
Qualquer noticia nova sobre eles, é como se eu recebesse boas novas de um irmão mais velho que não tive. É esse o tipo de relação que tenho com a música da dupla formada pelos irmãos Jim e William Reid.
Os irmãos Reid não são bem quistos pela comunidade musical indie e pessoalmente sempre tiveram uma relação nada saudável entre si, tão pouco com colaboradores. Nada do que ouvi de quem os conheceu é muito elogioso.
Do manager de outra banda indie vem a seguinte afirmativa “… they´re assholes”.
De um grande amigo que ficou próximo a eles por motivos profissionais, a impressão é meio parecida. São distantes, tediosos, não são equilibrados, tem problemas com bebidas, Jim e William alternam seus momentos de sobriedade com excessos com grande frequência.
Detalhes, apenas detalhes…
Fato novo e bom é que eles estão com disco novo e graças aos céus, é bom. O álbum parece seguir diretamente de Stoned And Dethroned (1994), não traz tanta distorção quanto poderia, mas mostra que eles continuam escrevendo canções simples e boas que se hoje não trazem mais a urgência e ambição de outrora, pelo menos mostram que no quesito “songwriters” eles nunca falharam e continuam bons.
O Jesus é uma banda que sempre caprichou nos seus discos e Damage And Joy mantem esse capricho.
Produzido por Youth (baixista do Killing Joke, que produziu Paul Mccartney, tocou com Kate Bush e David Gilmour e tem um currículo bem casca grossa), o disco brilha com um certo peso que faltava ao som do Jesus e tem graves mais vistosos (visível contribuição de Youth) e guitarras tão potentes que soam até anacrônicas mediante a bundamolice do atual cenário indie.
Boas participações femininas, algumas já habituais como Linda Fox (ex-Sister Vanilla) irmã caçula da clã Reid em “Los Felizes (Blues and Green)”, balada comum parecida com outras que eles já fizeram e na última “Can’t Stop The Rock”, quase uma canção cartão postal do som guitar do Jesus, ótima faixa pra terminar o álbum.
As outras participações são bem bonitinhas: Isobel Campbell, vocal do Belle And Sebastian, empresta sua doçura em duas faixas “Song For a Secret” ótima balada rocker e “The Two Of Us” bonitinha, com um tecladinho a la Belle And Sebastian. A novata Sky Ferreira vem docinha também em “Black And Blues”, uma das minhas favoritas do disco por enquanto.
O disco vem embalado de boas guitarras que trazem boas lembranças do som que caracterizou o Jesus (guitarras vintages semi-acusticas com pedais japoneses que espirram distorções, tocado em amps rústicos com muita valentia, coração e desequilíbrio).
A faixa que abre o álbum, “Amputation” vem pra cima vencedora, dançante nos convidando convincentemente a adentrar em sua capsula do tempo (afinal qualquer disco de rock feito hoje já nasce velho). Always Sad vem direto dos anos 90, não me admira se eles falarem que essa música é dessa época.
Outra boa desse disco é Presidici (Et Chapaquiditch), faixa bem roquinho inocente pra iniciantes.
Tudo isso faz de Damage um excelente disco com excelente música, numa época em que tudo é generativo, fraco e sem “substância”!
Que bom que estamos todos vivos para poder ouvir um disco novo do Jesus.
Lembro da primeira vez que escutei um disco dito de “techno” de ponta a ponta e achei realmente que o mundo tava mudando, ficando menos velho e isso foi bom!
Isso aconteceu em 1990 com o álbum 90 do 808 State (grupo que tive a sorte e privilégio de assistir ao vivo em 1996 abrindo pra Bjork no extinto Free Jazz Festival).
Ao longo dos anos, tal qual um Mr. Hyde escondido, meu amor por música eletrônica foi ocupando espaço ao passar da década de 90 e tive a sorte de ver o surgimento de alguns dos artistas mais talentosos e importantes não só dessa década, mas quiçá do gênero todo.
Underworld, Chemical Brothers, Roni Size, Moloko, Grooverider, Orbital, The Orb, Aphex Twin, Goldie, Portishead, Sneaker Pimps, Adamski, Dj Shadow, Paul Oackenfold, and go on… a lista é imensa.
E claro que de paraquedas, uma pá de gente resolveu se meter a fazer musica eletrônica também e muitos deram com os burros n’água e como hoje em dia, muitos deles posam de santos ou vacas sagradas, resolvi listar os piores casos de “apropriação cultural” da cultura “Clubber” por “não clubbers”:
Gargalhadas são permitidas:
10o David Bowie – Earthling (1997)
Sim, David Bowie tem lugar garantido no topo de qualquer lista que voce possa imaginar (melhor disco de Glam Rock, melhor disco de Krautrock de artista não alemão, melhor disco de Pop anos 80 e melhor disco póstumo), mas o camaleão também cometeu seus pecados e tentar fazer um disco de rock com drum and bass foi um tremendo furo, mas por absoluto respeito ao gênio e mesmo quando ela escorrega a gente respeita, ele fica em 10o .
9o Eric Clapton – Pilgrim (1998)
O “Deus” da guitarra não afirmou com todas as letras que esse é um disco de “techno”, mas foi assim que sua gravadora o apresentou ao mundo. Movido por baterias eletrônicas e sintetizadores programados por Simon Climie (da dupla de tecno pop oitentista Climie Fisher) o álbum é regularmente esquecido pelos fãs do guitarrista e muitas vezes, até por ele próprio mesmo tendo sido um de seus melhores resultados comerciais desde o Acustico.
8o John Lydon – Psycho’s Path (1997)
Conhecendo o nosso amável Johnny Rotten, ele sempre quis que o mundo pegasse fogo, então não consigo botar muita fé que ele tenha feito essa porcaria de cara lavada. Pra mim, foi alguma aposta que ele ganhou por ter feito um disco tão ruim assim. E olha que tem uns discos do P.I.L. que são duros de ouvir, mas esse é imbatível no quesito trashice.
7o Barão Vermelho – Puro Extase (1998)
Essa foi a onda mais errada do Barão, pois não deu pra entender se eles tinham entendido o que era “Techno”, pois a única coisa de dançante que a banda fazia era mais responsabilidade do Peninha do que da bateria eletrônica. O disco teve Hits, mas é ruim demais… eu gosto do Barão, mas esse não dá pra defender não.
6o David Byrne – The Visible Man (1998)
Byrne é gênio, acho que quando ele e eu formos para o além mundo, alguém vai descobrir que esse disco é muito avançado pra sua época ou pra qualquer época, mas enquanto nada disso acontece, o que tenho a dizer dessa porcaria é que ela só reforça a minha tese de que a carreira solo de Byrne só se salva por que ele montou o selo Luaka Bop que lançou pro mundo alguns dos discos mais legais que tenho aqui em casa, além de ter ajudado o Tom Zé a ganhar uma sobrevida artística mais que merecida.
5o Varios Artistas – Spawn O.S.T (1997)
Ah essa indústria cultural que me mata de orgulho.
Alguem teve uma brilhante ideia de aproveitar o auge do movimento de música eletrônica e casar artistas e djs com bandas de rock. No papel, as parcerias prometiam: Slayer e Atari Teenage Riot era promissor, e Prodigy com Tom Morello (Rage Against The Machine)? Outras boas ideias: Golide com Henry Rollins, Mansun com 808 State, etc. Mas o disco é uma merda, parece que eles tiveram meia hora cada um pra entregar o que tinham, e nessa época, 15 minutos era o tempo que eles tinham só pra ligar os equipos. Enfim, boa ideia, péssima execução.
4o Lulu Santos – Eu e Meme Meme e Eu (1995)
Visionário do caos, Lulu antecipou a febre de discos de Techno ruins antes de outros artistas. Ponto pra ele. Sem precisar defender o cantor carioca, mas no fundo acho que vale uma menção que eu acho o seu Assim Caminha a Humanidade uma beleza de álbum. Agora esse Meme e Eu é só mais uma prova de como se jogou dinheiro fora nesse negocio de indústria da Música.
3oU2 – Pop (1997)
Ri litros quando vi o Bono e o The Edge com camisetinha colada e dançando no clipe de Discoteque. Se em algum momento (e esse momento certamente existiu), eu tive algum respeito pelo quarteto irlandês, eles se dissipou com esse álbum e com a tune sequente. O disco tem algumas coisas que até passam, mas foi um movimento muito oportunista que daqui de São Caetano do Sul eu consegui enxergar pelos óculos escuros do Bono que ele não acreditava em uma virgula do que ele cantava.
2o Bloc Party – Intimacy Remixes (2009)
Pior do que uma banda véia tentar surfar numa onda que definitivamente não era a deles é ver um artista mais ou menos novo, que depois de lancar uma ou outra coisa razoável, me vem em pleno anos 2000 pegar um disco ruim (Intimacy) e lançar uma versão remixada horrorosa do mesmo álbum. Isso tudo em 2009, só uns 12 anos depois que essa onda tinha acabado. Trofeu Rubinho Barrichelo pro Bloc Party.
1o Bush – Deconstructed (1997)
Foi graças a minha linda e jovem namorada que buscou do fundo de sua lembrança clubber grunge, o álbum que ocupa com dignidade (ou não) esse ranking. Sem ela, o primeiro lugar dessa lista teria sido ocupado por outro álbum, mas relembrar que o Bush lançou no seu “auge” um disco de Remixes tosco desses me leva honestamente a duas perguntas pertinentes: 1. Por que as pessoas depois de duas décadas insistem que o Bush era uma banda boa? 2. Por que em algum momento, alguém achou que essa banda servia pra alguma coisa. Confesso, sempre detestei esses caras, e não adiantava botar o Steve Albini pra produzir disco. É uma m… sempre foi…. sempre será. Independente do gênero que eles toquem. Ponto.
Ps. : Menção honrosa:
R.E.M. – R.E.M. IX (2002)
O R.E.M. só escapou da lista pois não achei nenhum link confiável com esse álbum de remixes de faixas do álbum Reveal pra atestar se isso era ruim ou não.