Os meus anos 90 em discos – Parte 1

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Anos 90, década da minha juventude perdida.

A decada do Neo-liberalismo, da terceira via, do Plano Real, de Pete Sampras x Andre Agassi, de jogos do Campeonato Carioca de segunda-feira na Band, de Yahoo, Cadê e Altavista, de Tiazinha, Feiticeira e Hzetes, de Britpop, Grunge, Tecno e Pos-Rock.

Assim como os anos 90 findaram o glorioso e tenebroso século XX, parece também que os últimos grandes discos que realmente interessam surgiram nesse periodo (em breve um post sobre os anos de 1991 e 1997 especificamente).

Devorava de tudo, começava a desbravar os gêneros e não me limitava mais ao rock and roll. Cavucava no passado, mas o presente era tão empolgante, existiam tantos artistas bons fazendo coisas interessantes que tudo o mais ficou velho. O novo era o que mandava!

Não vou listar aqui nenhum guia definitivo da decada, poucos aqui se encontrarão em listas de entendidos ou especialistas, mas essa não é a intenção também.

A lista é um guia pessoal meu, discos pelos quais guardo imenso carinho e amor e que me fazem bem ou mal ainda hoje. Há aqui discos que fizeram verdadeiros estragos na minha cachola e outros que simplesmente esquentam meu coração.

Por ser um post longo, dividi a lista em duas. Ao longo dessa semana ou semana que vem mando os 10 derradeiros.

Enjoy the ride!

  1. BellRays – Let It Blast (1998)

Imagine um som que tenha a pegada e o poder de fogo de um MC5 com uma cantora a la Tina Turner a frente. Essa era ou ainda é a formula do BellRays, e esse álbum de estreia deles lançado no final da década de 90 é absolutamente arrasador. Rock vintage antes de virar objeto de adoração hipster nos anos 2000, esse álbum é alto, vigoroso e bom de cabo a rabo. Good Behavior não faria feio em nenhuma banda californiana dos anos 60, Black Honey é daqueles milagres de composição que tudo é absolutamente perfeito. Atenção, se você for escutar esse álbum no Spotify, a sequencia lá está errada e Black Honey lá é a faixa Blues For Godzilla.

 

  1. The Posies – Amazing Disgrace (1996)

Herdeiros diretos do power pop perfeito praticado pelo Big Star nos anos 70, The Posies atingiu a perfeição nesse algum maravilhoso e cantarolável em quase todas as faixas. De tão bom que eles são/eram, dois deles acompanharam Alex Chilton num breve retorno do Big Star nos anos 90. Barulhento e melodioso, chegou a ter música nos hit parade de rádios rock com a linda Please Return It. E olha que nem é a melhor do disco: Grant Hart, Everybody Is A Fucking Liar e Daily Mutilation só não tocaram no radio por causa de seus conteúdos líricos impróprios.

 

  1. Girls Against Boys – House of GVSB (1996)

Esse é daqueles álbuns impossíveis de se imaginar gravado em outra década que não fossem os anos 90. Dois baixistas apaixonados por black music, um baterista monstro e um cantor bastante emotivo. A combinação estranha chegou ao perfeito desequilíbrio nesse álbum. A banda tinha tanto potencial que em seguida foram contratados por um grande selo, tinham tudo para explodir mas não deu certo, o mundo já era outro. House of GVSB tem 3 clássicos de 1996: Super-fire, Disco Six Six Six e a já nascida antológica Crash 17 (X-Rated Car).

 

  1. Bailter Space – B.E.I.P (1993)

A misteriosa e estranha banda da Nova Zelândia Bailter Space provou que qualquer um podia fazer música. Olhando para os fulanos, eles tem cara de tudo menos de roqueiros, mesmo assim conseguiram fazer um bom nome no underground global, quando esse negocio ainda existia. Ep de 4 faixas que mostram bem o som noise, mantrico e torturado da banda. 4 faixas impecáveis do bom indie rock noventista, com destaque para X (minha favorita) e Projects (estranhíssima). As vezes, menos é mais e esse é o melhor exemplo que conheço.

 

  1. Underworld – Second Toughest In The Infants (1996)

1996 foi o ano em que o “Tecno” tomou conta do mundo. A música eletrônica chegava de assalto ao mainstream e o Underworld lançou, na minha opinião, o disco mais importante do gênero nos anos 90. Há quem goste de outros, mas não dá pra negar a importância desse petardo. Definiu um gênero, nasceu grandioso, relevante e ainda hoje é um álbum absolutamente atual e poderoso. Me acompanhou em muitas viagens de carro e em muitas noites de discman… Juanita e Rowla são as duas pepitas desse clássico.

 

  1. Magoo – The Soateramic Sounds Of… (1997)

Banda de guitar rock inglesa que não deu muito certo, mas que caiu nas graças de John Peel e lançou um dos discos mais obscuros de 1997, o ano em que tudo aconteceu no mundo da música. Esse pequeno e agraciado álbum contem algumas das minhas músicas favoritas dos anos 90 como The Starter’s Gun, Red Lines e a absoluta Your Only Friend, cujo refrão poderia ser um hino de uma geração “sometimes music is your only friend”. De cair uma lagrimazinha…

 

  1. Guided By Voices – Under The Bushes Under The Stars (1996)

Robert Pollard e sua turma produziram dezenas de álbuns nos anos 90, alguns clássicos como Bee Thousand ou Allen Lanes, alguns bons como Mag Earwhig!, mas nesse álbum de 1996, eles cometeram algumas faixas que nasceram históricas e clássicas como The Official Ironmen Rally Song, Your Name Is Wild e Drag Days. Hinos obrigatórios pra todo o mundo que um dia se fez de franjinha nessa década.

 

  1. Reverend Horton Heat – The Full-Custom Gospel Sounds Of (1993)

Não consegui me decidir sobre qual álbum do Reverendo escolher, fiquei entre esse e o álbum de estreia Smoke’em if You Got’em, ambos escutados até furar. O voto de minerva foi 400 Bucks, possivelmente o melhor rock vintage feito nos anos 90. Muitas vezes o disco não precisa mudar o mundo, ele só precisa ser muito legal, mas legal nível “muito do caralho” e esse é o caso desse disco.

 

  1. The Nomads – Powerstrip (1994)

Outra banda do coração. Diretos da Suécia, essa banda de rock garagista me deu algumas das maiores alegrias que se pode ter ao escutar discos e especialmente nesse álbum, tem a melhor balada de rock dos anos 90 ou pelo menos a minha balada rock favorita: Sacred. O resto do disco é sensacional, mas Sacred já seria suficiente para dar esse ranking pra banda.

 

  1. The Mummies – Never Been Caught (1992)

Quando a lenda a respeito dos Mummies chegou por aqui, e ao mesmo tempo consegui achar seus álbuns tive pela primeira vez a certeza de achar uma banda pra chamar de minha. Mais tarde, descobri alguns outros fãs ilustres como o pessoal do saudoso Garagem, extinto programa de rádio que tocava só coisa boa e era apresentado pelos jornalistas André Barcinski, Paulo Cesar Martim e Alvaro Pereira Jr. A banda já nasceu “mitada”, 4 caras que tocavam trajados como múmias, saiam em turnê num carro funerário, tocavam rock garageiro poderoso e tinham um pacto de que se um dia fossem convidados para gravar por uma grande gravadora eles acabariam com a banda, um dia o convite veio e eles realmente encerraram as atividades por um tempo (hoje eles costumam tocar por ai). Ps.: é o único dos discos que nunca foi lançado em CD, eles se recusavam a lançar no formato.

… Stay tuned for more rock and roll… em breve o meu top 10.

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Nick Cave – Sobre mágica e perda

 

Nick Cave & The Bad Seeds está com disco novo na praça.

Isso já seria, em tempos atuais, com o tal “indie” caminhando a passos largos para a extinção completa de seus mananciais de criatividade em quase todos as esferas, uma excelente noticia.

Nunca se espera um disco médio ou morno deles, e de vez em quando alguns superaram o patamar do espetacular como The Boatman’s Call, de 1997, álbum que na época passou batido por muitos ouvidos e críticos, mas foi um jeito lindo de traduzir a fossa e a tristeza de seu rompimento amoroso com a cantora Pj Harvey em um pop barroco.

Como fã, acho que seu ponto alto no lirismo culpado-cristão com sons de cabaret beira do fim do mundo previsto no “Bom Livro”, onde demônios parecem tomar corpo e forma, se apossar de notas e acordes e desabar sob as cabeças dos homens e mulheres de todas as eras ainda são os álbuns Tender Prey e From Here To Eternity, feitos nos anos 80 e que retratavam um Cave face a face com a sombra de sua morte, caminhando sob uma navalha que por muito pouco não o levou dali mesmo para os braços do Senhor.

Passado esse inferno, Cave passou as décadas seguintes catalizando essas experiências em álbuns poderosos, socando o rosto da mesmice e brindado o público com uma incrível variação de potencia que variava de acordo com seus estados de espirito.

Tudo ia bem até que uma nova tragédia caisse no colo da família Cave. Seu filho Arthur, de 15 anos morre em um acidente em julho de 2015.

Passado mais de um ano e ainda com essa dor terrível em seus ombros e de seu família, Cave resolve exorciza-la em forma de disco e assim nasceu Skeleton Tree, talvez o réquiem sobre perda pessoal mais triste e soturno que já ouvi.

Até esse álbum ser lançado, acho que só Lou Reed havia produzido arte suprema usando dessa substancia inevitável, delicada e terrível chamada morte em seu álbum de 1992 chamado Magic And Loss.

Se a vida é uma jornada em busca de conhecimento, evolução e felicidade, é preciso lembrar que o fim dessa jornada é o mesmo para todos. A morte chega implacável e certeira e numa vida longa, perdemos tanto quanto ganhamos e Cave trata dessas perdas de um modo delicado como talvez nenhum outro artista dentro do gênero o fez até então.

Skeleton é lento, mas um falso lento. O arrebatamento se dá em picos, enquanto a cama conduzida ao piano, leva o disco todo.

Canções como I Need You e Distant Sky procuram confortar ao mesmo tempo que as lagrimas caem pelo rosto.

Skeleton Tree, a faixa titulo que encerra o álbum lembra o barroco Boatman’s Call, (seu disco de fossa).

Jesus Alone, faixa que abre o disco parece a sonorização de um arrastar por entre os corredores da saída do luto, quando a dor já está menor mas ainda aguda.

Nick Cave sempre transformou a dor em grandes canções e com esse acidentado e triste novo álbum, o luto ganhou outro significado.

Se da tristeza mais profunda nasceu um disco tão dolorido e ao mesmo tão bonito, ficamos nós, como meros ouvintes e admiradores numa situação paradoxal diante da beleza fúnebre de uma obra tão poderosa como Skeleton Tree, pois, mesmo sabendo da força motriz por trás do álbum não nos furtamos do prazer e da comovente experiência de ser arrebatado por uma obra-prima arrancada de entranhas machucadas com tamanha sinceridade e urgência que nos faz testemunhas de um raro evento em tempos tão sombrios e ao mesmo tempo tão fortuitos.

Cave entrega algo enorme para a posteridade, assim como David Bowie o fez no começo do ano com seu crepuscular Blackstar, 2016 será lembrado por esses dois álbuns-eventos isolados que falam do fim e da morte e nos trazem algo maior e quase não mundano.


Os 5 discos que mataram o rock independente.

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Esses dias, tava eu lá no Cine Joia vendo o show do Swervedriver, banda de showgaze do começo dos anos 90 nem boa e nem ruim e de repente me dei conta que há 20 anos eu era o “descoladinho” ou “franjinha”: termo usado para pessoas que curtiam um som “alternativo” a lá Pixies, Teenage Fanclub, Inspiral Carpets e principalmente My Bloody Valentine.

Hoje isso pode significar o “hipster”, criatura tão criticada, mas que existe um pouquinho em cada um de nós.

Não sei se o passar dos anos foi me deixando mais chato (acho que sim), mas o tal “indie rock” que aprendi a adorar deixou de ser o sub-genero do rock instigante pra se transformar em mainstream e trilha de propagandas de aparelhos de celular, carros SUV e se converter no novo pop.

Nada contra, pode ter sido um caminho natural, mas não deixa de ser triste e chato.

Abaixo os 5 discos que destruíram o “Indie Rock”.

5. Wilco – Yankee Hotel Foxtrot (2002)

Acho a indústria fonográfica mais corrompida e burra que qualquer outra, mas com relação a esse disco, eu to com o então presidente da Warner Music que se recusou a lança-lo por ter achado muito anti-comercial. Acho que ele já sabia que o fim do rock e do indie rock seria sacramentado com esse monumento pretensioso e tentou dar uma sobre-vida ao gênero. Ok, eu sei que nada disso passou pela cabeça do CEO em questão, mas por 3 segundos eu gostaria que esse tivesse sido o real motivo. Essa história só ajudou a alimentar esse maldito monstro chamado “opinião pública” e disco sendo chatíssimo como ele é, caiu como uma luva no colo da então vivida critica atuante e o álbum foi catapultado a picos de “obra-prima” pra cima. Pra constar, eu amo o Wilco dos 3 primeiros discos, mas o que veio depois é de lascar de tão chato e esse disco pretensioso, com os rasgados elogios que se seguiram só serviram para apontar direções erradas aos artistas que seguiram em frente.

 

  1. Belle And Sebastian – If You’re Feeling Sinister (1996)

Eu estava lá e já era grandinho quando esse disco foi lançado. O frisson causado pelo octeto escocês no então “subterrâneo” foi tamanha que ninguém parece ter se recuperado do xororô ainda e novas gerações de músicos continuam chorando sobre esse leite derramado chamado “indie”. O disco nem é de todo o ruim, só fica ruim mesmo quando Isobel Campbell e Stuart Murdock começam a cantar juntos… O Belle até tem coisas boas, mas esse disco influenciou tanta coisa ruim, que merece posição de destaque nesse ranking.

 

  1. Coldplay – Parachutes (1999)

Uma única razão para esse disco estar na lista: ele é/foi considerado um disco de “indie Rock”. Sem mais.

 

  1. Radiohead – Ok Computer (1997)

Antes das pedras começarem a voar na minha direção, faço o mea culpa: Eu comprei esse Cd no dia do lançamento, gostei dele por um bom tempo, culminando com o tempo em que era fã do Smashing Pumpkins e de rock progressivo. Coincidência ou não, quando voltei a repudiar os Pumpkins e o Rock Progressivo, o amor por Ok Computer acabou também. O Radiohead sempre quis ser mais do que uma boa banda de britpop que eles foram e com esse álbum eles deram um gigantesco passo pra fora do estereótipo que carregavam de britpop, criando um outro pior, 0 Radiohead não só sepultou o Indie Rock, como também sepultou o rock como um todo. Com esse álbum, todo mundo virou “Rococó”, todo mundo que fazia discos legais passaram a fazer álbuns “conceituais” ou “muito elaborados” pra tentar alcançar o “nível de excelência” alcançado pelo quinteto de Oxford. Correndo os olhos em algumas listas de melhores do ano da NME dos anos seguintes, praticamente não se teve mais discos com guitarras. Mercury Rev, Flaming Lips, dentre outros lançaram seus álbuns “conceituais” em detrimento de seu bom som guitarristico que vinham tramando e bandas que se mantiveram nas guitarras passaram em brancas nuvens. A música rock pós Ok Computer ficou muito chata.

 

  1. Arcade Fire – The Funeral (2004)

Afirmar somente que não consigo entender por que todo mundo ama essa banda e esse disco seria somente um sinal de que estou velho e essa choradeira pretensiosa não me atinge mais. Mas eu AINDA gosto de música chorosa, e acho que até pra ser choroso e frágil dá pra se fazer isso com um mínimo de classe e honra. Nick Drake fez ótima música chorosa, Tindersticks também e se procurar por ai até tem gente nova fazendo isso com certa competência. (se alguém achar, me avise). Mas não é só o fato desse lixo desse Arcade Fire ser tão amado (que não é problema, pois não se escolhe o que você vai amar, ama-se e pronto), e gosto popular normalmente é genuíno e verdadeiro e não há problema em se amar coisa ruim (eu adoro um monte de disco que não vale nada), mas o que mais me impressiona e ler gente que “teoricamente” manja desse negócio de indie ou rock se derramar em elogios pra esse embuste. Cheguei nesse “enterro” bem tarde, deve ter sido uns 7 anos depois de ter sido lançado, portanto passei por ele sem ser tapeado. São 10 faixas que juntando não daria um EP meia-boca. O problema do Arcade Fire é que eles fazem músicas e discos que duram o dobro do que deveriam. As músicas de 5 minutos deveriam durar uns 2, as que tem 2 nem precisavam existir.

Menções honrosas da chatice indie:

Modest Mouse – Good News For People Who Loves Bad News (2004)

Fleet Foxes – Fleet Foxes (2008)

Bon Iver – Bon Iver (2011)

Arcade Fire – Suburbs (2010)