Paulinho da Viola – Foi Um Rio que Passou Em Minha Vida (1970)

É injusto e incorreto escolher só um disco do mestre carioca.

Mas, por algum a gente precisa começar, certo?

No melhor critério, “uni duni te” fiquei indeciso entre “Nervos de Aço” e o “Paulinho da Viola” de 1971 — aquele em que ele tá encostado no maior estilo no batente de uma porta de madeira azul.

Nem um, nem outro, optei pelo segundo disco solo do gênio.

Praticamente todo composto de músicas próprias, Paulinho é a ponte suspensa entre o velho samba, os velhos choros e a velha guarda com um novo modo de fazer o samba que seria desencadeado nos anos seguintes.

Ele era o barroco entre os modernistas.

Quando o Brasil explodia com movimentos da Jovem Guarda e do Tropicalismo e do samba rock de Jorge Ben e Mutantes, Paulinho prestava reverência ao antigo.

Paulinho é tradição, e suas lindas composições só mostram que ele não pertencia a uma época e a um tempo específicos, mas sim a um lugar e a um sentimento genuinamente brazucas.

Lugar e sentimentos que nunca ficariam datados.

Voou pra fora dos morros cariocas e dos subúrbios e atingiu corações aflitos por lindas musicas Brasil afora, falando das coisas pequenas e importantes da vida: amor, desilusões, vacilos, amizade e traição foram temas recorrentes na temática do mestre.

Mas tudo era diferente.

Falando do cotidiano sem se limitar a ele, Paulinho tinha a capacidade de transcender e libertar-se das amarras pra atingir alguns dos mais líricos momentos da música brasileira. Esbanjando uma classe e finesse únicas, a gentileza e a inteligência para desfilar seus sambas me trazem a mente dois compositores distantes no tempo mas com a mesma vibe: Noel Rosa e Cole Porter.

É viagem minha, mas o Paulinho pra mim é o encontro dessas duas entidades musicais. Ou no mínimo, o irmão mais novo deles.

Foi Um Rio… só comprovaria o que já estava na cara de todo mundo desde 1965. Paulinho é o maior sambista dessa Era e isso não é pouca coisa. Nesse segundo álbum, Paulinho desfilou algumas das suas mais belas composições como “Não Quero Você Assim”, “Lamentação” e o clássico instantâneo “Foi Um Rio Que Passou Em Minha Vida”, alternando com a leveza de “Papo Furado” e a tristeza de “Mesmo Sem Alegria”.

Paulinho é o lorde do Samba. Gênio que mereceria reverência sempre e a todo momento.

Podia começar com um Box com sua obra completa, que tal?

 


Mogwai – Young Team (1997)

O Mogwai é um banda preguiçosa.

Seu som é preguiçoso.

O Mogwai é mais preguiçoso que Dorival Caymmi.

O Mogwai é o Caymmi do indie rock instrumental experimental.

Calma, nada disso é pejorativo, trata-se apenas de uma constatação refletida sob as luzes dos fatos expostos e que nunca tinha me atentado em todos esses anos que acompanho os discos e shows dos escoceses.

O som do Mogwai é circuncêntrico e pouca coisa acontece nos seus álbuns, mas dentro do magma central, um turbilhão de guitarras distorcidas, junto a uma bateria por vezes nervosa, se formam como maremotos e da mesma maneira que emergem e agridem os ouvidos despreparados, lentamente desaparecem, diminuem seu volume e tudo acontece como um relógio.

Preciso e mortal.

O Mogwai conseguiu inventar Ambient Music barulhenta.

Toda a mecânica é igual a da Ambient: repetitiva, lenta, longa, composta por camadas que se somam, atingem seu topo quando tudo entra junto depois de 8 compassos, e devagarzinho vão saindo de cena.

Seria o “Ambient Hardcore”?

Viagem minha?

Enfim, de toda a discografia do Mogwai, resolvi puxar o álbum que rendeu mais fama e rasgados elogios de John Peel pra falar aqui (até porque ainda é o que mais gosto deles).

Young Team surgiu no meio da então onda do “pós-rock”, onde bandas e artistas transados faziam discos barulhentos, com influência de jazz, progressivo, Fugazi e sem vocal. Dentre elas destacaram-se: Tortoise, Trans Am e Dirty Three.

Young Team tem alguns dos melhores timbres de guitarras tirados na década de 1990, e ainda me lembro vividamente da sensação de fim de mundo que foi a apresentação deles aqui no Brasil há mais de 10 anos, onde as cadeiras do teatro do Sesc Vila Mariana pareciam que viriam a baixo tamanho o barulho provocado pelos escoceses.

Tive quase certeza que viria a baixo mesmo em “Like Herod”: Ensurdecedora, os ecos desse ruído ainda reverberam no meu cerebelo.

Show inesquecível, banda sensacional.

O álbum é a quintessência do Mogwai: coisas acontecendo aqui e acolá, explosões de um lado, quietude nervosa na maior parte do tempo, ótimos achados estruturais e boa música para se digitar sem perder a concentração.


Gene Clark – White Light (1971)

Esse não é recomendável aos fracos.

Se você acha o Wilco o máximo, prepare-se para se encontrar com o cara que inventou esse negocio de folk-rock ou country-rock-indie.

O Wilco é o máximo, mas se você quiser ir um pouco mais fundo na introspecção que uma boa canção levada no violão e composta como um artesão das palavras e das melodias, prepare-se para conhecer Gene Clark.

O cara foi uma lenda!

Dylan pagava um pau danado pra ele.

Clark era um baita cantor, um ótimo compositor, excelente letrista e carregava no seu semblante e na sua embocadura o sofrimento e o mistério que todo bom menestrel da canção precisa ter.

Nos anos 60 ele fez parte do Byrds (só por isso, já merece vossa atenção), já no fim dos anos 60 e começo dos 70 ele se lançou em carreira solo, que prometia ser sucesso puro.

Além de tudo isso acima citado, o danado era bem apessoado, “tipão”, tinha o shape para virar o grande rock star dos anos 70.

Pois é, tinha… mas não rolou….

Por que?

Mistérios…

Fato é o seguinte: White Light é um dos mais bonitos e líricos momentos do folk americano. E mais, é o disco que o Dylan queria ter feito e nao fez e a inveja e admiração por Clark foi uma das poucas “bandeiras explicitas” que o senhor Zimmerman se permitiu fazer ao longo de sua vida.

Até porque inveja mortal, Dylan tinha era do bardo canadense de sobrenome Cohen…

Mas ai é outra história.

Canções que beiram a perfeição, Clark mostra porque num time que tinha David Crosby e Roger McGuinn ele se destacou como a principal forca musical dos Byrds…

Caraca, isso não é pouca coisa!

Soturno e meio tristonho, o álbum se revela logo na capa. Uma linda foto no breu de uma noite sem fim, com o cantor sentado ou agachado ano cantinho direito e o satélite natural favorito de 10 entre 10 poetas ao fundo num efeito simples, mas eficiente.

Acaricie vossos tímpanos, eles vao agradecer esse presente sonoro.

Depois você volta pro Wilco…


Adoniran Barbosa – Documento Inédito (…..)

Falar de S.Paulo sem citar Adoniran é como não ter falado nada de S. Paulo.

Tava lendo uma matéria sobre os novos artistas da cena paulistana que estão movimentando a opinião publica, a classe média limpinha e os Sescs com seus shows, canções e discos tentando traduzir o que é Sampa hoje. Sem sucesso.

Infelizmente nenhum deles consegue.

E não conseguem porque não tomaram o pulso da cidade, a grande maioria acha que Sampa é um aeroporto de gente vindo e indo ou acha que Sampa se resume a Vila Madalena e alto de Pinheiros e chama tudo depois do Ipiranga de ZL com desprezo.

Quem é do gueto canta pro gueto e que se foda.

Ninguém tenta ir além.

Uma amiga minha, analisando essa cena toda, sacramentou: tudo não passa de um simulacro de realidade.

Até acho alguns desses artistas bem competentes, mas tenho que concordar com ela.

Quase nenhum deles é “For Real”.

Pensando nessa situação e ouvindo esse disco do Adoniran, fica difícil não constatar essa óbvia situação.

Esse álbum é uma compilação de participações em programas de radio e TV, entrevistas, trechos de depoimentos e uns pedacinhos de gravações onde ele canta seus sambas seguidos de explanações profundas das origens deles e suas inspirações.

Delicioso é pouco, Adoniran é uma figura difícil de ser ignorada e impossível de não se gostar.

O disco abre com a antológica participação do compositor no programa “O Fino da Bossa” sendo entrevistado por ninguém menos que Elis Regina e a sintonia dos dois é fora do comum.

Fica nítida a admiração mutua, e em nenhum momento a aura do papo é quebrada para rasgação de ceda alheia. O papo é furadíssimo, mas profundo, dá pra ficar ouvindo milhões de vezes seguidas sem cansar.

Enfim, Adoniran produziu verdades absolutas que só quem mora nessa zorra urbana consegue captar, entender e rir.

Gênio da raça. Tenho orgulho de ser da mesma área que esse cara.

Boa noite.


Pavement – Wowee Zowee (1995)

Não acredite em Stephen Malkmus.

Stephen Malkmus não é e nunca foi um rock star confiável.

Debochado demais para ser sincero, sério demais para ser maluco, tudo no Pavement foi pensado e orquestrado em cima de regras e conceitos claros, eles nunca deram um passo pro lado sem saber se ia virar ou não.

Malkmus dever ser um dos 5 músicos mais inteligentes que surgiram no século XX, legitimo nerd musical e cobra criada que ouviu milhões de discos antes de começar a fazer os próprios e Wowee Zowee foi a prova dos 9.

Moldado dentro dos conformes indies básicos que viraram padrão dentro dos anos 90 (padrão esse que foi criado também pelo Pavement), Wowee é um petardo torto, barulhento, quebrado e paradigmático que pra muitos, é seu melhor momento.

Menos pop que Crooked Rain, Crooked Rain (1994), álbum que daria grande exposição ao grupo e no meio do caminho do experimental e genial Slanted and Enchanted (1992), este clássico absoluto também, Wowee sofreu de um grande mal: não tinha nenhum hit, por que se tivesse, a banda não seria lembrada só por fãs, especialistas em anos 90 e iniciados.

O Pavement seria banda lembrada tanto quanto um Smashing Pumpkins ou Nirvana e teria muito mais admiradores normais espalhados pelo mundo.

Como eu disse lá no começo, eram debochados demais para dar o passo adiante e encarar o precipício que os separaria dos demais mortais, passaria as escadas de Asgar e atingiriam um tipo de topo onde poucos chegam.

Tecnicamente impecável, o som caminha pelos experimentos provocados por Captain Beefheart, Faust e Zappa (todo o layout da capa lembra muito as bagunças que FZ cometia nos anos 70), mas todos traduzidos brilhantemente para a década barulhenta, individualista e estranha que foi.

Algumas das melhores musicas que o grupo fez estão aqui: Black Out tem um dos melhores e mais bonitos timbres de guitarras produzidos pela banda, Serpentine Pad é uma pedrada a la Sonic Youth, curta e poderosa. E Best Friend’s Arm? Não é simplesmente o máximo? Corre, breca, corre, breca.. qual é a deles?

Tem umas fáceis também: AT & T é perfeita balada pop esquisita onde a banda se deixa levar por um caminho mais fácil que dificilmente eles optaram em seguir.

Enfim, um disco duca e essa edição remasterizada de 2006 ainda traz um segundo cd de sobras de estúdio, mais lados B lançados somente em singles e música pra cacete (50 no total).

Vale cada centavo suado.

O Pavement é uma das bandas da minha vida e pronto.


George Gershwin – The Piano Rolls, Vol.2 (1995)

Antes de virar o maior compositor norte-americano da primeira metade do século XX (polêmica!), Gershwin, como todo filho de imigrante morando em Nova York, com poucos recursos, muita energia, sem medo do labor e numa fase importante de transição mundial (1900 a 1925), acabou encontrando na então ascendente indústria musical que nascia sua porta de entrada para ganhar dinheiro e ascender como músico.

O piano deixava de ser o instrumento de status social da era vitoriana destinado a mocinhas e recatadas donas de casa, para virar um dos principais suportes para a indústria da música que começava a nascer junto com o novo século e se tornar a mais rentável e importante fonte de entretetimento do inicio do século XX (antes do surgimento do Cinema e do Disco).

A procura por pianistas e compositores de canções populares que pudessem ser tocadas por qualquer um e que agradassem a grande massa de novos ouvintes que queriam diversão para compensar a dureza do dia-a-dia.

Assim o piano foi o instrumento mais popular nesse período.

The Piano Rolls é uma série de gravações digitalmente recuperadas dos primeiros rolos gravados pelo então muito jovem pianista e futuro compositor George Gershwin tocando temas populares do final da década de 1910 e inicio dos anos 20, desfilando uma deliciosa seleção de ragtimes, charlestones e canções que marcariam o nascimento do jazz como conheceríamos anos depois.

Um período de classe sem duvida, e o som que nos chega hoje, graças a esse rico trabalho de recuperação digital desses documentos sonoros revelam o espirito empreendedor e poderoso que nascia na necessidade vital de criar sonhos e alívios que os EUA fariam ao longo do século e na figura de Gershwin em particular, o homem se tornaria importante tradutor dessa potência cultural que todos nós conheceríamos, invejaríamos e admiraríamos nas décadas seguintes.

Vindo do povo e para o povo, Gershwin começava nessas despretensiosas canções a cravar sua marca na cultura popular americana e por conseguinte, mundial.

Delicie-se.


Beastie Boys – Check Your Head (1992)

Quebro a sequencia do pianinho por uma razão justa, justíssima!

Adam “MCA” Yauch deixou o mundo nessa sexta-feira, dia 04 e se você não conhece o figura, pelamordedeus… vai filho, usa essa internet e vai atrás!

O Beastie Boys é uma das minhas bandas favoritas all-time pelo simples motivo deles serem uma banda no melhor sentido da palavra: leais um ao outro, unidos, sinérgicos, que só foram o que foram porque eram uma força musical de 3 cabeças sintonizadas que cresceram se apoiando e apoiando outros artistas e principalmente, fazendo discos do caralho.

Difícil escolher um para comentar, pois todos os discos deles são bons.

Em 25 anos de carreira, eles foram os pioneiros do hip-hop moderno e os primeiros a flertar não só com o rock, mas com jazz, samba, música africana, sons eletrônicos, rumba, country, hardcore e tudo o mais que passasse pelos toca-discos dos caras.

A absoluta ausência de preconceitos dos caras, somado a talento e instintos musicais apurados, fizeram com que os bestiais suplantassem o gênero e fizessem história.

Check Your Head foi meu primeiro contato com o som deles e levei um tempo para entender o que tudo aquilo significava, afinal, estávamos em 1992 e tinha muita coisa acontecendo e muita coisa para assimilar: grunge no seu Top, Ministry, indie rock barulhento cheio de guitarras por todos os lados, Helmet e por ai vai.

Ai vem os Beastie Boys com esse caldeirão sonoro rico, impregnado de samplers maneros, rap com eletrônico, hardcore, levadas sonoras viajantes e zoa tudo (no bom sentido)…

Esse álbum é pouco citado, mas foi em Check Your Head que os Beastie Boys consolidaram sua carreira, ganharam a moral que precisavam depois do genial, mas mal aceito Paul’s Boutique (1989), álbum muito “avançado” para a época, que vendeu mal e só ganhou a alcunha de obra-prima anos depois, desta forma, Check Your Head ajudou a garantir longevidade ao trio e garantiu também a possibilidade de álbuns monstruosos como Ill Communication (1994) e Hello Nasty (1998) que vieram na sequencia e são irretocáveis também.

O repertório do disco é de tirar o folego: Jimmy James, Gratitude (um baita groove pesadão onde os 3 BB mostram que são músicos fudidos), Finger Lickin Good e So Whatcha Want estão entre as melhores do grupo. Time For Livin é hardcore skatista como poucos e lá pro final o grupo reserva suas experiências relaxadas e deliciosas como In 3’s e Groove Holmes.

Ainda por cima, o álbum foi a porta de entrada para o tecladista Money Mark mostrar seu talento, bem como o produtor brazuca radicado nos EUA Mario Caldato Jr.

Em 1995, os caras passaram por Sampa e fizeram um dos melhores shows que meus olhos e ouvidos já viram e ouviram em toda a existência dessa pessoinha e guardo no fundo da memória e do coração com carinho e saudade esse baita momento.

Poucas vezes me lembro de ter saído de um show com a alma tão lavada quanto nesse dia.

Citando a faixa que fecha esse album: Namasté MCA!


Jean Jacques Perrey – Moog Indigo (1970)

“Efeitos avançados de eletrônica criados pelo fabuloso SINTETIZADOR MOOG”.

Esse é o trecho que encerra o texto de apresentacão que ilustra a contra capa desse vinil editado originalmente no brazilzão pelo selo Discos Copacabana por volta dos anos 70 (como todo bom vinil nacional da época, não há nenhuma referencia de quando saiu por aqui).

Moog Indigo é obra do músico/cientista/moderno/biruta portador de uma cabeça genial, com parafusos soltinhos e sem nenhum medo do perigo: Jean Jacques Perrey.

Nos anos 60, fez dupla com Gershon Kingsley (outro alucinado) e juntos foram percursores do lounge eletrônico, dos primeiros experimentos com osciladores, sintetizadores e moogs e deram os primeiros passos para tornar a música eletrônica mais palatável ao gosto popular e tirar o ranço “acadêmico” que o tal gênero “eletroacusitco” estava confinado em salas de concerto vanguardistas e na mão de maletas dodecafônicos minimalistas absolutamente boring.

Eles queriam aproximar esse experimentos eletrônicos da musica popular.

E conseguiram… de um jeito meio torto mas conseguiram.

Dá para achar no youtube uma série de vídeos dos músicos se apresentando em programas de TV, cercados de suas engenhocas e olhados pelos convidados dos programas, pela plateia e pelo apresentador como se fossem aliens vindo de Marte.

Mas voltando ao disco de hoje…

Moog Indigo é todo construído ao som do sintetizador moog e muitos dos temas desse álbum aparecem ou apareceram em vinhetas de comerciais de TV, de abertura de programas de TV ou como fundo musical em quadros de humor.

Talvez o tema mais famoso seja “The Elephant Never Forgets”, que ficou famosíssimo por ser a vinheta do seriado Chaves (na versão original do seriado, El Chavo Del Ocho).

Ensolarado, experimental, mas extremamente pop, esse álbum garantiu sua longevidade e influencia e deixou de ser simplesmente uma peraltice musical que ficaria datada quando nova moda tomasse o globo.

Jean é competente compositor, com altíssimo senso de tempo e escolha inteligente de timbres que tiram o foco do experimento sonoro e joga luz para o que realmente interessa que é a música e não somente o meio utilizado.

Temas como “E.V.A” e “Soul City” caberiam em qualquer disco do Air fácil e seriam as melhores faixas em qualquer disco do Metronomy ou do Toro Y Moi.

Depois dele, ficaria difícil não se apaixonar pelas possibilidades abertas pelos seus moogs e toda uma revolução foi construída ao longo das décadas seguintes.


Nina Simone – Live At Montreux 1976 (2011)

Até o fim dessa semana só vou selecionar discos com a temática ligada ao instrumento dos instrumentos: O Piano.

É a minha homenagem aos grandes pianistas, cantores e compositores que voltaram a dar as caras com discos aguardados, inesperados ou simplesmente pintaram para dizer um oi.

Fiona Apple abandonou sua precoce aposentadoria e lança play novo em alguns meses. Regina Spektor volta a ativa com ótima música (quem sabe agora eu presto atenção nela) e Dr. John (é ele, o próprio) ressurge das catacumbas de New Orleans acompanhado dos Black Keys.

Por enquanto nenhum deles entra nessa lista, assim, começo a série com essa apresentação arrasadora da diva do soul, do blues e do jazz Nina Simone.

Em 1976, ela chegava aos 43 e estava mais incrível do que nunca, cantando com sua voz grave, de timbre estranho e poderosa.

Um show intimista, incomum e num ritmo impossível de ser repetido.

Livre de qualquer amarra estética, Nina dá um banho de interpretação ao piano e no palco ela é uma entertainer como poucas. Joga conversa fiada, conta histórias, se confessa, canta, toca, dá ordem na platéia e faz seu show, em que rigorosamente tudo pode acontecer.

Imprevisível e instável, Nina era um fio desencapado e sua música flutua por essa instabilidade emocional que gerou algumas das interpretações mais passionais da música pop de todos os tempos.

Em 1976 ela já era uma veterana, mas se vale de sua vasta experiência nos palcos, somente para dar conta de fazer o simples, o belo e balanço irresistíveis.

Repertório incrível, show foda, cantora que não se faz mais e performer original.

This lady is not a tramp!


Burning Spear – Marcus Garvey/ Garvey’s Ghost (1975/76)

Nunca fui um grande fã de reggae.

Na verdade ainda estou longe de ser um grande ativista do ritmo.

Não sou maconheiro, nem surfista, nem fã da mamãe natureza e não frequento muito a praia, logo fica difícil me aprofundar na coisa.

Assim prefiro só a parte musical.

Comecei a escutar reggae e dub há uns 4 ou 5 anos.

Antes tarde do que nunca. Cada disco bom que descobri nessa jornada!

Cada nova descoberta é comemorada como cada nova peça de música clássica que descubro e me apaixono.

Bizarro hã?

Whatever, os caminhos que nos levam são estranhos e tortuosos.

Marcus Garvey foi um dos primeiros ativistas negros a lutar por direitos raciais igualitários nos Eua.

Jamaicano de nascimento, o homem ganhou uma bela homenagem nesse discasso clássico do reggae, e um dos mais emblemáticos álbuns produzidos na ilha.

Um time espetacular de músicos se juntaram a Winston Rodney, vulgo Burning Spear, e quando o ritmo jamaicano ganhava o mundo com Bob Marley, Peter Tosh, Jimmy Cliff entre outros, Burning Spear também ganhou seu espaço merecido dentro da realeza reggaeira, com seu discurso afiado e som mais afiado ainda.

O álbum fez enorme sucesso na Jamaica e hoje é reconhecido como um dos mais importantes álbuns da historia do reggae. Pedrada das boas.

Carrega no seu som, os melhores elementos possíveis. Linhas de baixo precisas e gordonas, bateria sincopada e de timbragem inimitável, o tecladinho e órgãos básicos para fazer aquela caminha deliciosa que todo reggae decente tem, linhas de metais que entram estrategicamente pontuando o calor da torcida e anunciando a benção divina ao som gerado, além, claro das letras politicas e canções poderosas pronunciadas pelo porta-voz Burning Spear.

Marcus Garvey é uma ótima porta de entrada para quem não conhece nada de reggae e quer se aventurar nas delicias tropicais da ilha.

Salve jah!