Mstislav Rostropovich – Cello Concertos (1978)

Rostropovich não foi somente um dos mais completos celistas de todos os tempos, como também foi uma figura politica muito importante.

Abandonou o regime comunista e atacou diretamente seus camaradas dirigentes, o que lhe rendeu asilo imediato da antiga União Soviética.

Pelo mundo, desfilou seu talento e versatilidade em centenas de concertos e gravaçõese aqui foi capturado tocando o fino do barroco em uma de suas mais brilhantes atuações.

Neste concerto, ele toca Boccherini, Vivaldi e Tartini, ou seja, deleite absoluto para quem ama Cello e para quem ama o barroco (esse é o meu caso).

Se vivo estivesse, certamente estaria chutando a bunda dos atuais lideres russos e quem sabe não chamaria as meninas do Pussy Riot para uma parceria.

Defende-las seria o mínimo que esse senhor faria.


Smack – Ao Vivo no Mosh / Noite e Dia (1984-1986)

Essa turma era do tempo em que ser indie significava:

Bater muito a cabeça;

Explicar milhões de vezes que tipo de som você ouvia e mesmo assim pouca gente entender;

Falar de bandas que ninguém conhecia;

Torrar toda a sua grana para conseguir ouvir e ter os discos legais que não saiam por aqui;

Torrar toda a sua grana se você quisesse tocar sons diferentes.

Isso era ser indie nessa época e não era nada facil.

E tudo se orientava para o rock, pos-punk, punk, mod e quetais e essa era a praia do Smack.

Banda paulistana que tinha na sua formação músicos, jornalistas e fanáticos por rock que queriam botar as mãos na massa e fazer música boa, pra frente, alinhada com esse som underground que se fazia na gringa.

De todos, Edgard Scandurra era de longe o mais talentoso e não por menos, foi o que seguiu mais longe e ganhou a merecida fama de guitarrista mais original do Brasil nos últimos 30 anos.

O Smack era o pos-punk tardio que também foi tardio em grande parte do globo, mas só o fato deles terem existido e feito o que fizeram, mereciam uma estatua na frente de cada barzinho que se vangloria de tocar indie rock.

Eles foram nossa vanguarda e ninguém realmente deu bola pra isso.


Vários Artistas – 7”Up! Singles Only UK 1978-1982 (….)

Ai Inglaterra, what a place.

Lá na ilha, algumas tradições não desapareceram com a modernidade.

O chá;

A monarquia;

E os compactos!

Compactos esses que saíram e ainda saem aos milhões.

Todo artista tem que fazer um compacto caso ele queira ser aceito na comunidade musical inglesa e principalmente pelo público.

Muitos desses hoje valem uma nota.

John Peel era um devoto fã dessa modalidade.

Enfim, tudo isso pra dizer o seguinte:

7” Up! É uma compilação feita na Alemanha onde os organizadores se focaram em compactos (somente compactos) de punk, pós-punk e new wave entre 78 e 82 e conseguiram fazer a melhor coletânea de obscuridades desse período que eu já ouvi.

Graças a esse cd, tomei contato com artistas que jamais teria como Glaxo Babies, Brian Brian, Weekend, I Jog & the Tracksuits, dentre outros.

E melhor, uma música mais fantástica que a outra.

O que dizer de: Dont Try To Cure Yourself da banda They Must Be Russians (uma das minhas favoritas all-time), que consiste em uma descrição pormenorizada e cientifica da gonorreia com um riff explosivo e simples substituindo um refrão que não existe.

Rigosoramente enquadrados nesse gênero refrescantes e libertador que foi o punk, são bandas que simplesmente evaporaram da face da Terra, tanto que dois deles sequer foram localizados para autorizar essas faixas nesse CD.

Precioso e necessário, essa é uma coletânea que poderia salvar a vida de qualquer um.


Leonard Cohen – Live At The Isle Of Wight 1970 (2009)

As vezes, quando tudo tem jeito que vai dar errado, o errado acaba errando e dá certo, sabe cumé?

Figura isso:

Festival de música no cú da Inglaterra, multidão muito doida de todas as drogas possíveis e imagináveis, somado a um clima de hostilidade entre artistas e plateia, principalmente plateia, que já havia atirado paus e garrafas em Kris Kristofferson, aprontado baderna no show da cândida Joan Baez e tacado o foda-se no de Hendrix.

Motivo: hiperlotacao, um publico que seria estimado em 600.000 para uma quantidade de ingressos de 150.000, ou seja 450.000 penetras.

Ai sobra para um ainda pouco conhecido cantor e compositor canadense a missão de subir ao palco as 2 da manhã num clima de horror, tocando com uma banda boa mas não completamente ensaiada e depois da apresentação habitualmente incendiaria de Hendrix.

Pronto… merda a caminho!

Ai é que um milagre se fez.

E o curandeiro atendeu pelo nome de Leonard Cohen.

Esse álbum é o registro matador e definitivo desse balsamo que foi capaz de calar, arrepiar e pacificar 600.000 selvagens, quando ninguém acreditava mais que o festival não fosse terminar sem morte, destruição e tragédia.

Mostrando um poder de comunicação impressionante, Cohen brindou a plateia com um show transcendental, poético e de beleza impossíveis de serem ignoradas e combatidas.

Passeando pelo folk, sua voz grave, anasalada e reconfortante foi um sossega-leão coletivo, caiu como uma luva e virou esse CD com DVD impressionantes, com o show na integra, além de depoimentos de testemunhas do show e músicos.


Meat Puppets – Huevos (1987)

O Meat Puppets é uma banda difícil de se gostar logo de cara.

O som deles sempre foi propositalmente estranho, mesmo sendo ridiculamente trivial e convencional.

Guitarra, baixo e bateria e só.

Solos de guitarra para carai…

Referencias da banda: ZZ Top e Grateful Dead.

Claro que tudo devidamente revisado para os anos 80, década de florescimento do rock alternativo americano e diretamente da SST, a melhor gravadora de rock oitentista, não tinha como sair errado.

Caipirassos e matutos, já tão na pista desde 1982 sem parar, produzindo ótimos discos ao longo desse tempo todo.

Por uma dessas inconscistencias que acontecem na vida, toda a discografia dos caras foi lançada no Brasil nos anos 90 para os 2000 pela quase extinta Trama e esse Huevos é resgate dessa leva.

Um dos discos menos importantes da carreira do Meat, mas que por razoes cientificamente inexplicáveis é o que eu mais gosto deles, por que talvez seja o disco mais bem resolvido e ao mesmo tempo ainda rápido, riffudo e com um timbre de bateria chapada que eu simplesmente amo ouvir em rock.

Quase um Southern rock punk.

I love it, i really do.


Isaac Hayes – Hot Buttered Soul (1969)

E diz se 1969 não foi um ano muito foda?

Tenho ouvido esse cd no meu “discman” na ida e volta ao trabalho há pelo menos uma semana seguida…

É, você leu direito, eu escrevi “discman”, é esse o “device” que eu prefiro para escutar música em locomoção pela cidade e no transporte coletivo. Com um fone razoável, dá pra ouvir musica na melhor e mais barata qualidade possível sem ficar dando pala pra malandro, afinal, quem vai querer roubar um Discman…

Pois bem, o “Chef” tem sussurrado seu soul arrastado e viajandão acompanhado pelos fabulosos BarKeys na minha orelha a semana toda e a cada nova audição, uma nova descoberta, uma batida nova que pinta junto ao ruído do metro, uma virada que se modifica e se revela ao longo das 4 músicas presentes nesse álbum, que se alongam em viagens sonoras onde cada músico tempera cada faixa com seu mel, com sua pimenta e deixando o “chef” livre para entrar só quando tiver vontade, afinal esse é um disco pra quem curte “som”.

O “som” desse álbum é surreal e irreproduzível em formato digital, simplesmente não cabe em wav ou mp3.

Ou é tudo ou é nada com ele.

Ou você dá atenção aos pormenores desse filé, ou vai deixar passar batido toda a riqueza soul contida nessa pepita…

Acompanhado dos Barkeys, que estavam na ponta dos cascos, Isaac revisita e reinventa dois standards da música americana: Walk On By e By The Time I get to Phoenix que respectivamente abrem e fecham Hot Buttered Soul e no miolo tem Hyperbolicsyllabicsequedalymistic e One Woman, dois temas originais absurdos.

Hot Buttered Soul deve ser o disco mais sampleado de Hayes, e seus grooves foram usados por todo mundo desde então.

Uma aula de soul e veneno.


Jack Bruce – Songs for a Tailor (1969)

Ta ai mais um daqueles músicos enigmáticos que surgem de tempos em tempos, segue zilhoes de caminhos, tocam de tudo e ajudaram a revolucionar o rock e o blues inglês.

O cara é fora da casinha.

Ainda tá vivo e ativo, seu som hoje é étereo e inclassificável, já não segue rótulos musicais há um tempão.

Coisas de gênio.

Songs for a Tailor foi o primeiro álbum solo de Jack com o fim do Cream e na minha opinião, o melhor, e mais bem resolvido deles.

Inspirado, Jack despejou algumas de suas melhores músicas que não couberam no Cream e contou com uma turminha do barulho para acompanha-lo (George Harrison, Jon Hiseman, Dick Heckstall e Felix Pappalardi), não conheçe? Procure saber então…

Fazendo o som que praticamente todos os grandes faziam na época, e grandes eu incluo Tim Hardin, Nick Drake, Traffic, Family, Wishbone Ash e por ai vai nessa viagem mais sofisticada, elaborada e rica que poucas vezes se ouviu na história.

Depois desse, as viagens de Bruce ficariam absurdamente herméticas, idiossincráticas e de difícil degustação, mas como ele é gênio e eu não, a culpa é mais minha que dele, afinal ele sabe de coisas que me esforço pra entender ou conhecer.


Ministry – Psalm 69 (1992)

Resolvi me dar um mimo essa semana.

A edição 180 gramas de Psalm 69 para botar no prato, girar o volume para o talo e ouvi-lo todinho, com todo o peso, velocidade, insanidade que nunca achei em nenhum outro álbum desde que me conheço por gente.

Não quer dizer que não tenham melhores, mais pesados ou tão insanos, mas Psalm teve o timing perfeito, saiu na época certa, nem um mês antes, nem um mês depois, cravado no incrível ano de 1992, no ano em que o bom rock tomava de assalto as paradas com os grunges de plantão, abrindo espaço que artistas como o Ministry, que já tinham batido na trave pudessem dessa vez acertar um sem-pulo no angulo como poucas vezes se ouviu.

Não sei como vai ser o juízo final, mas se existir um juízo final de verdade, como descrito no “Bom Livro” e existir alguma sonorização que represente a ruina, o pavor e a catástrofe, esse álbum certamente poderia preencher esse vazio.

Galgando entre o Industrial e o Heavy Metal, o Ministry sempre foi inclassificável e seus mentores: Al Jourgensen e Paul Baker fazem o contraponto da insanidade com o rigor de caxias, suficientes e eficazes para transformar a fúria em uma produção expansiva, mecânica e milimetricamente calculada em cada uma de suas explosões.

Resumo. Doido, mas friamente planejado.

Assim como o fim do mundo.


The Boomtown Rats – A Tonic For The Troops (1978)

Bob Geldof foi só um cara legal que liderou uma banda legal de New Wave dentre um zilhão de outras.

Eu disse foi, e isso foi antes dele se meter a salvador da pátria, virar ativista xiita chato visionário, criar o Live Aid (o similar a Revista Caras para artistas engajados) e por fim antes de cometer I Dont Like Mondays (música que se encaixa no padrão “Mais Ruim que Merda”).

Antes de tudo isso, ele fez um disco legal que é justamente esse sensacional A Tonic For The Troops.

Com todos os elementos que um belo disco de new wave precisa, A Tonic é a ponte exata entre a fúria do punk, o desleixo carpe diem da new wave e a descrença niilista do Pós-punk, mas com a luminosidade que músicos de bem com a vida conseguem imprimir no som.

Limpo quando tem que ser limpo, sujinho quando precisa, o Boomtown Rats conseguiu entregar canções sofisticadas, com bons arranjos, altos e baixos com perfeito senso pop, jovem sem ser retardado.

Depois desse, o Boomtown Rats seria só mais um no meio da multidão, sofisticando demais seu som, mas sem a graça desse inicio.

Até que o espertão Bob Geldof fez tudo aquilo que já tratamos por aqui.

E deixou de ser só o carinha legal.


Hubble Bubble – Faking (1979)

Punk belga hoje…

A única banda de punk e new wave belga que conhecia era o Plastic Bertrand, que nem é tão punk assim, mas a Belgica não é uma Inglaterra ou Estados Unidos, lá tudo é certinho, todo mundo tem a mesma cor, curtem um chocolate e tem uma estatua do Tin-Tin em Bruxelas.

Mas o Hubble Buble é até uma surpresa.

Não adianta procurar muita coisa pela internet, que as informações não são confiáveis.

Mas como esse blog não é informativo e sim opinativo… tudo certo!

Excelente álbum, talvez seja o melhor disco de punk pop produzido na Bélgica, o que não quer dizer muita coisa também.

O Hubble Buble foi um projeto de um dos integrantes do Plastic Bertrand, antes do Plastic Bertrand existir, assim o som da banda é menos punk e mais próximo do pub rock que se fez antes da explosão punk e new wave.

Guitarras espertas, canções pop excelentes e ótimo approach, Faking é um LP sensacional e voltado especialmente para os já iniciados em punk pop setentista e oitentista e para quem gosta de escavar preciosidades e raridades perdidas no tempo.